Time
is honey
Poucas
coisas neste mundo são mais tristes do que um bolo industrializado. Ali no
supermercado, diante da embalagem plástica histericamente colorida, suspiro e
penso: estamos perdidos. Bolo industrializado é como amor de prostituta, feliz
natal de caixa automático, bom dia da Blockbuster. É um anti-bolo. Não
discuto aqui o gosto, a textura, a qualidade ou abundância do recheio de
baunilha, chocolate ou qualquer outro sabor. (O capitalismo, quando se mete a
fazer alguma coisa, faz muito bem feito). O problema não é de paladar, meu
caro, é uma questão de princípios. Acredito que o mercado de fato melhore
muitas coisas. Podem privatizar a telefonia, as estradas, as siderúrgicas. Mas
não toquem no bolo! Ele não precisa de eficiência. Ele é o exemplo, talvez anacrônico,
de um tempo que não é dinheiro. Um tempo íntimo, vagaroso, inútil, em que um
momento pode ser vivido no presente, pelo que ele tem ali, e não como meio
para, com o objetivo de. Engana-se quem pensa que o bolo é um alimento. Nada
disso. Alimento é carboidrato, é proteína, é vitamina, é o que a gente come
para continuar em pé, para ir trabalhar e pagar as contas. Bolo não. É uma
demonstração de carinho de uma pessoa a outra. É um mimo de avó. Um
acontecimento inesperado que irrompe no meio da tarde, alardeando seu cheiro do
forno para a casa, da casa para a rua e da rua para o mundo. É o que a gente
come só para matar a vontade, para ficar feliz, é um elogio ao supérfluo, à
graça, à alegria de estarmos vivos. A minha geração talvez seja a primeira que
pôde crescer e tornar-se adulto sem saber fritar um bife. O mercado (tanto com
m maiúsculo como minúsculo) nos oferece saladas lavadas, pratos congelados,
comida desidratada, self-services e deliverys. Cortar, refogar, assar e fritar
são verbos pretéritos. Se você acha que é tudo bem, o problema é seu. Eu vou
espernear o quanto puder. Se entregarmos até o bolo aos códigos de barras,
estaremos abrindo mão de vez da autonomia, da liberdade, do que temos de mais
profundamente humano. Porque o próximo passo será privatizar as avós, estatizar
a poesia, plastificar o amor, desidratar o mar e diagramar as nuvens.
Tô
fora.
(Antonio
Prata)
Tantas ideias surgem deste texto e as suas, onde estão?
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